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Docking Molecular na Indústria Farmacêutica: uma ferramenta valiosa para análises in silico

     O docking molecular é uma técnica computacional usada para prever a interação entre duas ou mais moléculas, geralmente uma proteína ou outra macromolécula com papel biológico, e um ligante, que pode ser uma pequena molécula que seja substrato da proteína ou que possua algum potencial bioativo. Assim, ao possibilitar uma simulação de como uma molécula pequena pode se ligar a uma proteína alvo, identificando o potencial de ligação e a afinidade entre elas, por exemplo, o docking se torna crucial na produção de novos fármacos. Esse método baseado em estrutura é utilizado nas fases iniciais de triagem virtual de medicamentos, ajudando a prever como e se uma molécula se liga a uma proteína alvo, identificando compostos promissores. Desse modo, sua principal aplicação é encontrar substâncias ativas (hit) que serão analisadas e otimizadas até a escolha do composto protótipo (lead), que pode se tornar um potencial medicamento. O docking molecular é altamente valorizado por sua capacidade de acelerar a descoberta de medicamentos, reduzindo a necessidade de triagens experimentais que são caras e excessivamente demoradas, e, portanto, permite a triagem de grandes bibliotecas de pequenas moléculas em menos tempo e com um menor uso de recursos financeiros. 
     Desde os anos 1960, o docking evoluiu significativamente, impulsionado por avanços em física, química, tecnologia da informação, bioquímica e computação. Ao longo dos anos, o docking foi crucial no desenvolvimento de diversos medicamentos, como por exemplo para o Alzheimer. Hoje, o docking é uma ferramenta essencial nas técnicas de Computer-Aided Drug Design (CADD), usada não só na triagem de fármacos, mas também para investigar interações proteína-proteína e o comportamento de nanomateriais. Grandes empresas farmacêuticas frequentemente possuem departamentos inteiros dedicados a essa técnica, sendo uma área com muitas oportunidades para bioinformatas. 
     Existem diversos tipos de docking molecular, sendo uma de suas classificações mais importantes, o docking flexível e o docking rígido. No docking rígido, tanto a proteína quanto o ligante são fixos, sem permitir mudanças nos ângulos ou comprimentos das ligações. Com isso, surgem algumas limitações como a ausência de captura de conformações alteradas no sítio de ligação, o que pode levar a previsões imprecisas quando o ligante induz mudanças estruturais na proteína, aspecto que pode ser importante na funcionalidade de algumas delas. Já o docking flexível permite mudanças conformacionais na proteína e no ligante, possibilitando ajustes mais realistas e, por conseguinte, acaba sendo mais preciso na modelagem de interações que envolvem mudanças na estrutura da proteína, entretanto, requer mais tempo e capacidade computacional. Outras variações na metodologia do docking incluem variação de solvatação, de pH e a presença ou ausência de água, aspectos que podem ser vitais para o entendimento da interação da molécula ligante com a proteína alvo. Desse modo, a escolha do método e das condições em que as interações serão analisadas, dependem da capacidade do hardware computacional e das características da proteína-alvo.
     Além disso, o docking molecular se baseia em alguns modelos bioquímicos, sendo os principais o modelo chave e fechadura, o qual pressupõe que o ligante se encaixa exatamente no sítio de ligação fixo, o modelo de isomerismo conformacional que considera diferentes conformações químicas do ligante, o modelo de ajuste induzido no qual o sítio de ligação da proteína muda o seu formato ao se ligar ao ligante, e por fim, no modelo de seleção conformacional o ligante apenas consegue se ligar a uma conformação pré-existente da proteína. Assim, há uma grande importância na escolha do modelo certo, pois um docking que desconsidera aspectos como, por exemplo, alterações no sítio de ligação e utiliza apenas proteínas fixas pode resultar em erros significativos quando o ligante induz mudanças conformacionais na proteína. 
     Ainda que o docking molecular seja uma ferramenta muito útil e amplamente utilizada, as previsões feitas por docking nem sempre são precisas devido às limitações nos algoritmos e modelos usados, o que pode resultar em previsões que não correspondem ao comportamento real das moléculas em sistemas biológicos. Isso se deve principalmente à complexidade biológica: a interação entre moléculas e proteínas é extremamente complicada, e não só isso, é inviável desconsiderar o microambiente celular no qual essas interações e reações ocorrem, aspecto muitas vezes negligenciado pelos algoritmos. Os modelos de docking podem não conseguir capturar todas as nuances dessas interações, como a flexibilidade do receptor e do ligante, efeitos de solvatação e dinâmica conformacional, ainda que existam softwares que tentem abarcar tais aspectos. Um outro ponto a se tomar cuidado é que os resultados do docking são altamente dependentes da qualidade das estruturas de entrada, assim, a análise também pode ser comprometida pelo uso de bancos de dados inadequados, por exemplo, com erros nas estruturas proteicas ou nos modelos de ligantes, inconsistências estas que podem levar a resultados incorretos, diminuindo a relevância dos compostos triados, seja falhando em identificar compostos potencialmente bioativos ou ao sugerir compostos que não são viáveis bioquimicamente. 
     Em conclusão, o docking molecular é uma ferramenta muito importante para a indústria farmacêutica e deve ser observada com cuidado para a obtenção dos dados desejados sobre as substâncias ativas, na qualidade exigida pelas agências de regulação, a fim de, em algum momento, resultar em um medicamento comercializável e potencialmente salvar vidas.

REFERÊNCIAS

 

Laura da Silva Ribeiro de Souza, 2024

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