


Meningite amebiana primária (MAP) - O que é?
Existe muita desinformação acerca de doenças parasitárias, o que inevitavelmente causa temor e grandes preocupações na população. É comum vermos na mídia matérias sensacionalistas que apenas agravam essa situação, não fornecendo nenhuma informação de fato para acalmar e conscientizar quanto às formas de infecção e tratamento. A meningite amebiana primária é um exemplo disso, pois sua causadora (a ameba Naegleria fowleri) é constantemente vinculada nas mídias como “ameba comedora de cérebro”.
A ameba Naegleria fowleri é um microrganismo unicelular de vida livre, encontrado mundialmente em ambientes de água doce e quente. Seu ciclo de vida começa com sua forma em cisto na água (forma não parasitária), logo então passando para uma forma nadante ativa chamada Trophozoito, podendo sofrer mitose ou evoluir para a forma flagelada (capaz de infectar humanos). Nesse estado, é por meio do contato com a mucosa nasal que a ameba se "infiltra" em seu hospedeiro. Agarrando-se aos nervos olfativos, esse microrganismo segue caminho em direção ao cérebro, seu único obstáculo é deslizar através da placa cribriforme, um osso sulcado no teto das passagens nasais que permite a passagem dos nervos olfativos através de pequenos orifícios.
Após isso, a N. fowleri chega ao bulbo olfativo, onde começa a alimentar-se do tecido cerebral e células imunológicas, o que torna a ação do sistema imunológico inútil. A incapacidade de defesa ocorre também pelo fato da ameba exalar enzimas que explodem e destroem células e nervos. Esse processo parasitário é chamado de meningite amebiana primária (MAP), e, apesar de raro, é extremamente letal. É uma doença mais suscetível de acometer crianças e jovens, por conta da porosidade apresentada na placa cribiforme, que facilita a entrada da N. fowleri no cérebro. Dentre os infectados, apenas um número muito baixo sobrevive, isso deve-se à rápida contaminação, pois a ameba chega ao cérebro em menos de alguns dias, e ao deterioramento grave do hospedeiro em apenas poucas semanas.
Devido a esse curto espaço de tempo, é difícil estudar com precisão quais drogas e tratamentos são mais efetivos contra a doença, porém medicamentos como anfotericina B e miltefosina, além de hipotermia medicamente induzida (para diminuir inchaço cerebral), mostraram-se eficazes para tratar e curar os únicos cinco pacientes norte-americanos que sobreviveram, entre 1978 e 2016. No entanto, não é somente EUA e México que sofrem com
os casos de MAP, como foi dito, essa ameba pode ser encontrada por todo o mundo, preferencialmente no verão. Países como Argentina e Espanha já relataram óbitos devido à meningite amebiana primária, as vítimas eram jovens e foram infectadas por águas de lago e piscina mal cuidada, respectivamente.
O preocupante seria a ocorrência de MAP no Brasil, o que chegou a ser documentado em 1985. Na época, cinco casos foram relatados, mas apenas um foi analisado e confirmado a presença da N. fowleri, além disso, a análise ocorreu somente após a morte da vítima. Por conta da rápida evolução do quadro clínico e a demora do diagnóstico, fica evidente que no país existe uma defasagem nas notificações da doença, tornando assim difícil documentar e tratar os casos de MAP. O que se pode fazer, contudo, é tomar as devidas profilaxias contra a doença. Sendo assim, é importante evitar águas quentes e paradas de lagos ou rios, piscinas sem o devido tratamento com cloro, caso em contato com esse tipo de ambiente é importante proteger o nariz para que a N. fowleri não entre no organismo.
É necessário acabar com essa demonização de doenças parasitárias, visto que seu único efeito é o terror sobre a população (principalmente a mais vulnerável a elas). A informação científica sobre o assunto é sempre o melhor caminho para entender e prevenir doenças, sejam elas quais forem. Ao entender o ciclo de vida da ameba N. fowleri, o contexto histórico, casos reais e profilaxias, o indivíduo não só passa a se proteger como também entende e se relaciona melhor com o ambiente à sua volta.
Giovanna Pinho
REFERÊNCIAS
Brain-eating amoeba kills again—here’s how it kills and how to avoid it | Ars Technica. (n.d.). Retrieved from https://arstechnica.com/science/2019/07/brain-eating-amoeba-kills-again-heres-how-it-kills-a nd-how-to-avoid-it/
Grace, E., Asbill, S., & Virga, K. (2015). Naegleria fowleri: pathogenesis, diagnosis, and treatment options. Antimicrobial Agents and Chemotherapy, 59(11), 6677–6681. https://doi.org/10.1128/AAC.01293-15
Linam, W. M., Ahmed, M., Cope, J. R., Chu, C., Visvesvara, G. S., da Silva, A. J., Qvarnstrom, Y., & Green, J. (2015). Successful treatment of an adolescent with naegleria fowleri primary amebic meningoencephalitis. Pediatrics, 135(3), e744–e748. https://doi.org/10.1542/peds.2014-2292