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Abelhas sem ferrão: quem são

Abelhas são insetos pertencentes à ordem Hymenoptera e são parentes muito próximos de outros insetos como vespas e formigas, estes três artrópodes sendo enquadrados filogeneticamente no táxon Aculeata, grupo que reúne aqueles himenópteros com ferrão, derivado do aparelho ovopositor. Além de partilharem o característico ferrão, estes insetos compartilham a particular “cintura de vespa” (que se trata de uma constrição abdominal característica de grupo mais amplo denominado Apocrita) (Goulet & Huber, 1993).

Entretanto, as abelhas se distanciam de seus grupos-irmãos por possuírem certos hábitos e características completamente diferentes. Uma das caractéristicas é o hábito “vegetariano” das abelhas pois, enquanto vespas são acostumadas a ter como fonte proteíca a carne de outros insetos, as abelhas retiram sua proteína do pólen proveniente das flores de angiospermas. Outra característica relevante é a presença de pelos (ou, mais precisamente, cerdas) ramificadas pelo corpo, que permite que a coleta do pólen seja viabilizada (Silveira et al, 2002). Apesar de tão diferentes dos seus parentes, o fato permanece: uma das principais características evocadas por estes invertebrados no imaginário popular são as ferroadas doloridas, o perigo associado e as inúmeras recomendações de distância. O que a maioria das pessoas desconhece é a existência de um grupo de abelhas que vai contra as expectativas: as abelhas nativas sem ferrão.

As abelhas sem ferrão (comumente abreviadas como ASF) são abelhas cujo aparato ferroador tornou-se, ao longo de diversas pressões evolutivas, atrofiado, de forma que elas não são mais capazes de ferroar seus predadores (Hrncir et al, 2016). Apesar do conceito das ASF ser pouco conhecido pelo público em geral, várias espécies têm nomes populares amplamente reconhecidos como as jataís, írais e arapuás. Este grupo de abelhas concentra principalmente dois subgrupos: as abelhas trigoniformes, que compreende todos os gêneros de ASF cuja rainha é determinada pela quantidade de alimento que recebe, e as abelhas meliponas, que basicamente inclui apenas o gênero Melipona que reúne as espécies onde as rainhas são determinadas por fatores genéticos (Nogueira-Neto, 1997; Villas-Bôas, 2018).

As ASF ocupam principalmente as regiões tropicais do globo (Figura I) (Hrncir et al, 2018; Nogueira-Neto, 1997). É interessante destacar a presença notável delas na América Latina, tão notável que as civilizações nativo-americanas já sabiam como criar e conviver com estas abelhas; inclusive, as ASF eram tão importantes para os maias que seu panteão de deuses contava com um deus-abelha chamado Ah-Muzen-Cab (Hrncir et al, 2016; Villas-Bôas, 2018). No Brasil ocorrem cerca de 250 espécies de ASF e, portanto, muito contato ocorreu também entre os povos índigenas do Brasil com estes animais, de forma que  o nome popular de muitas destas espécies deriva de línguas e termos indígenas. Hoje, comunidades tradicionais também realizam muitas atividades com estas abelhas por todo o território nacional. (Villas-Bôas, 2018).

Zamudio & Alvarez (2022) confeccionaram um guia para identificação das abelhas sem ferrão presentes na tríplice fronteira, classificando-as a partir de entoespécies (classificação realizada por moradores locais a partir do conhecimento popular). A partir das 22 espécies listadas neste catálogo, é possível ter um pequeno vislumbre de toda a diversidade que existe deste tipo de abelha no Brasil: existem abelhas agressivas, como as tubunas (Scaptotrigona depilis) e Marmeladas (Frieseomellita varia), e existem abelhas mais mansas, como as jataís (Tetragonisca angustula)  e mirins  (Plebeia sp.) assim como existem abelhas que chegam a 10mm (como a Melipona quadrifasciata) enquanto outras não passam de 2,8mm (como a Leurotrigona muelleri).

Tendo em vista a tamanha diversidade e importância deste grupo, faz-se muito necessário que o conhecimento sobre ele se desenvolva e se popularize de forma que todos possam conhecer estas abelhas e atuar na conservação desta fauna tão única.

Gabriel Liboni

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